Angelical – Cap10 – O livro

No dia seguinte, Park In colocou o livro dentro de uma das telas que comprara para Há Na e levou-as consigo para a ala B. Assim que abriu a porta de vidro da cela, viu que ela não parecia bem.

– Eu trouxe aquilo que você me pediu: telas, pinceis e tintas. – disse ele, colocando as sacolas sobre a cama de Há Na. – Espero que isso te ajude, de verdade. E espero que você pinte coisas maravilhosas, como pêssegos… pêssegos e livros… gosto muito de livros… Em especial, os antigos.

– Eu também. – disse Ha Na, pegando a dica muito bem. – Então, vou pintar um livro para o senhor, já que gosta. Prefere que o pinte fechado ou aberto.

– Uhm… não sei… talvez fechado. Sabe… como se fosse um diário com fechadura e tudo…

– Quer que o pinte em um lugar claro ou escuro.

Claro… ou escuro? Como assim, ele não havia entendido. Seria algum código?

– Não sei… pinte onde desejar.

– Vou pintar num lugar escuro, então… onde não há nenhuma luz, nada de eletricidade… como se fosse na era medieval. Mas prometo que vai ficar muito bonito… um pouco sinistro, mas bonito.

– Ah… ok… vou aguardar… e prometo que vou pendurar o quadro no meu escritório. Mesmo que seja sinistro.

Era óbvio o que ela queria. As câmeras estavam ligadas ao sistema elétrico. Sem luz, ela poderia usar o livro sem que o conselho soubesse. Era escuridão que ela queria.

Precisava dar um jeito para dar um curto-circuito em toda a ala B e deixar tudo na escuridão, pelo menos pelo tempo necessário para ver o livro e fazer o que fosse necessário.

– Então, tá… prometo que vou terminar o quadro até hoje a noite, devo terminar lá pelas nove horas, o senhor virá buscar?

– Sim… venho às nove em ponto. – disse ele, anuindo com a cabeça para indicar que ele sabia que ela precisava fazer tudo até as nove da noite.

De volta ao seu escritório, Park In procurou pela planta do edifício até encontrar o que queria. Depois daquilo, precisou controlar a ansiedade.

Tentou fazer o seu trabalho da melhor forma possível, enquanto aguardava escurecer, mas era difícil manter o foco. Por sorte, era um homem muito metódico e todos os relatórios estavam em ordem.

– Não vai embora hoje, Dr. Hong? – perguntou Ah Ri. De fato, ele sempre saía antes da secretária, mas não naquela noite.

– Não, Ah Ri… preciso terminar um relatório e rever alguns prontuários. – mentiu ele, sorrindo para a secretária que o olhou com perspicácia.

– Não é bom que o senhor fique aqui durante a noite. Mas já que quer ficar, não vá a Ala B, por nada deste mundo. E se for, não fique lá mais do que alguns segundos. O senhor é um bom homem… eu gostaria que o senhor ficasse mais tempo conosco.

Park In não sabia se reprimia ou se agradecia à secretaria, então, resolveu ficar quieto, fingindo estar concentrado no seu notebook.

Depois que Ah Ri saiu, foi a vez de Peter entrar.

– Por que não foi embora ainda? – perguntou o psiquiatra, visivelmente desconfiado.

– Não lhe devo satisfação… – respondeu Park, sem tirar os olhos do notebook.

– Park In… por favor, não faça besteira… apenas obedeça ao conselho. Você será bem recompensado depois… Foi assim comigo.

– Recompensado? Às custas do sofrimento de uma menina?

– Por acaso está apaixonado por Há Na? – perguntou Peter, de forma bem agressiva – Por isso está fazendo a besteira de ir contra ao conselho? Tendo contato com aquela maluca, ajudando ela, limpando as feridas podres dela… você se apaixonou por uma paciente? Sabe que posso te reportar por isso…

– Podres??? Podres são as pessoas que ganham dinheiro e poder com o sofrimento dela. E não… não estou apaixonado por uma garota que poderia ser minha filha… ah por favor… Peter… não coloque em mim a culpa pelos seus pecados… E saia da minha sala agora… tenho muita coisa para fazer – mentiu ele. Sim… ele havia se apaixonado pela garota que era muito jovem, muito frágil e muito inocente para ele. E não, ele não tinha nada para fazer.

Assim que o Dr. Peter saiu, Park In acessou o acesso remoto das câmeras de segurança. O Dr. Peter estava no estacionamento. Parou para falar com uma mulher que parecia ser a socialite  Lee Ji Na. Os dois conversaram por algum tempo, mas ele não conseguia escutar o que diziam. Olhou pela janela discretamente. Lee Ji Na, sempre muito elegante, parecia estar muito zangada com Dr. Peter.

Depois de discutirem por quase meia hora, os dois entraram em seus carros e desapareceram na estrada para a cidade.

Park In conferiu a situação pelas câmeras. Havia poucos seguranças à noite e menos enfermeiros. Esperaria escurecer ainda mais…

Saiu do seu escritório quando faltava pouco para as nove. Percorreu o prédio da ala B por fora, com cuidado para não ser visto por nenhum segurança, nem ser pego pelas câmeras. Desceu por uma escada que dava para uma espécie de porão, onde também ficava a casa de máquinas. Seguindo por um corredor central, chegou perto do Gerador do prédio. Não bastava apenas desligar o gerador, pois sabia que logo um segurança apareceria para reestabelecer a energia elétrica. Ele precisava ganhar tempo para Há Na.

Abriu a tela de proteção e jogou ali o conteúdo de uma garrafa de água que trouxe consigo. O curto foi imediato. Faíscas se soltaram por todo o lugar, mas depois de alguns segundos, um estrondo fez-se ouvir e uma nuvem fedida invadiu todo o lugar.

Park In cobriu a boca com uma máscara preta e saiu do lugar o mais rápido possível. Deu a volta no prédio e depois entrou pelo corredor principal. Assim que viu um segurança correndo em sua direção, tirou a máscara.

– O que está acontecendo? Escutei um barulho? – perguntou ele, tentando disfarçar suas ações.

– Não sei, senhor, acho que deu um curto no gerador. Vou verificar… É melhor não entrar na Ala B, senhor. Sem luz o lugar fica… perigoso…

Park In esperou o homem desaparecer na escuridão, antes dele mesmo invadir a ala B.

Ao longe, viu alguns flashes de luz e logo o enfermeiro-chefe apareceu com uma lanterna em mãos.

– Doutor… a energia caiu. O gerador de emergência foi ligado, por isso, os prisioneiros estão em segurança. As celas não abriram.

“Gerador de Emergência?”, pensou ele. Ele não sabia que havia um gerador de emergência. Será que eles conseguiriam manter a luz acesa? Para seu alívio, o próprio enfermeiro respondeu às suas dúvidas.

– Não é suficiente para religar a luz, mas manterá as celas fechadas por pelo menos 6 horas, até resolverem esse problema. Mas se não resolverem, teremos que transferir os prisioneiros.

– Ok… vamos aguardar… se a luz não religarem, faremos isso. Agora, eu vou ver Há Na… ela deve estar com medo.   

Quando fez menção em tomar o corredor onde ficava a cela de Há Na, o enfermeiro segurou o seu braço.

– Por favor, doutor… não vá lá… sem luz… as coisas pioram… se o senhor for lá, pode ser atacado… pode morrer, doutor…

– Você sabe que eu não acredito nisso! – mentiu ele, e seguiu pelo corredor.

Queria poder manter o que dissera: não acreditar em nada daquilo. Com certeza, se não acreditasse, não estaria conspirando com uma paciente psiquiátrica para fazer um ritual para libertar um demônio do corpo dela.

Mas coisas demais aconteceram com ele para não acreditar. Precisava ajudar Há Na. E se tivesse que fazer isso, então faria.

Usou a lanterna do seu celular para chegar até a cela de Há Na. Ao iluminar o lugar, viu a garota sentada no centro da cela, tentando abrir o cadeado do livro.

– Não consigo enxergar direito. Não pensei que seria difícil de ler ou manusear o livro na escuridão.  – explicou ela.

– Espere… vou entrar aí… – disse ele, passando o cartão magnético na fenda.

Diferente das outras vezes, a porta abriu-se lentamente, como se não tivesse energia o suficiente para aquele ato.

Ele usou a luz do celular para iluminar o livro.

– Você sabe a senha do livro?

– Sim… é meu aniversário. – respondeu ela, terminando de abrir o livro.

Assim que as páginas se abriram, um cheiro forte de mofo e algo mais saiu do livro.

Park In escutou um estranho barulho em algum ponto da cela… parecia que a sombra que o perseguia estava ali agora.

livro

– Há Na… tem certeza de que isso funcionará? Será que não é necessário um xamã, um médium, ou um padre exorcista… como nos filmes?

– O conselho jamais deixaria isso acontecer… preciso tentar de qualquer forma… é minha última esperança – disse ela, folheando as páginas envelhecidas do livro.

– Achei.

Numa página com estranhos desenhos e escritas em chinês, Há Na leu, habilmente: 打開容器並釋放詭計。帶走,侵入靈魂的陰影,重複光明的黑暗。離開船隻,釋放自己。釋放自己。釋放自己。借助薩曼圖斯的力量……我命令:掙脫

Dǎkāi róngqì bìng shìfàng guǐjì. Dài zǒu, qīnrù línghún de yīnyǐng, chóngfù guāngmíng de hēi’àn. Líkāi chuánzhī, shìfàng zìjǐ. Shìfàng zìjǐ. Shìfàng zìjǐ. Jièzhù sà màn tú sī de lìliàng……wǒ mìnglìng: Zhēngtuō

Que quer dizer:

Abre-se receptáculo e liberte o ardil. Leve para longe, a sombra que invade a alma, a escuridão que repele a luz. Abandone o receptáculo, liberte-se. Liberte-se. Liberte-se. Pelo poder de Xamantus… eu ordeno: liberte-se!

Depois disso, Park In sentiu um estranho cheiro muito forte e um zunido ensurdecedor em sua ouvido. Sentiu uma forte dor em seu estômago e parecia que toda a energia do seu corpo havia sumido.

– O que está acontecendo…?  – ele tentou perguntar, mas antes que terminasse a frase, já havia desmaiado.