Capítulo 5 – O Assassino
Terrores noturnos. De novo. E de novo. E de novo.
A criatura em suas alucinações chegava cada vez mais perto. E mesmo sendo feita de névoa, a coisa segurou em seu antebraço. Park In gritou de dor pois era como se a criatura o queimasse.
Quando enfim se libertou do torpor e da alucinação, Park In acendeu as luzes e a criatura sumiu, desvanecendo no ar com um grunhido demoníaco.
“IN Na”, parecia dizer a nevoa negra enquanto se dissipava. In Na era o nome de sua falecida esposa. Era a morte da esposa que o atormentava.
Ele estava ensopado de suor e parecia que não havia dormido de tão exausto que estava.
Ao baixar os olhos, viu com terror que no antebraço havia marcas de cortes profundos, exatamente onde a criatura o agarrara.
Entretanto, Dr. Hong era cético demais para acreditar em algo sobrenatural. A resposta mais simples e segura era de que ele mesmo havia se automutilado.
E isso era ruim, muito ruim. Se ele fosse um de seus pacientes, isso seria o suficiente para interná-lo e medicá-lo até que os sintomas melhorassem.
Não podia mais negar. Ele estava com EPT (Estresse Pós-Traumático) mais forte do que ele imaginava e não iria passar. Isso porque os sintomas estavam se complicando, transformando-se em esquizofrenia psicótica com automutilação.
Não poderia mais evitar, ele teria que falar com alguém. Talvez se afastar do seu cargo.
Tirar algumas semanas sabáticas enquanto se tratava.
Ao chegar no trabalho, Park In pensava em se consultar com o Dr. Peter. Entretanto, assim que pisou na sua sala, Ah Ri veio correndo lhe avisar que havia chegado o paciente da penitenciária de Seul.
– Há um problema no prontuário desse paciente, Dr. Hong – informou Ah Ri, preocupada – o senhor preencheu errado o número da cela. O senhor colocou B16, mas essa cela não pode ser ocupada. É a cela do lado de Ha Na.
– Todas as outras celas estão ocupadas, Ah Ri. E o paciente veio com a firme orientação de ficar sozinho em cela, até receber outra determinação do médico psiquiatra. Ele será paciente do Dr. Peter.
– Então… em primeiro lugar, Dr. Hong, é que essa cela nunca é ocupada, por razões que o senhor já sabe. E em segundo lugar, o Dr. Peter jamais chega perto da cela B17, onde a paciente Ha Na está.
Park In ficou analisando o rosto sério e preocupado de Ah Ri por alguns instantes. Ele poderia remanejar os pacientes de um ala para outra, a fim de vagar uma cela para o novo paciente, mas era quase um absurdo deixar salas lotadas quando havia quase quatro celas vagas ao redor de Ha Na que nem deveria estar em uma cela de segurança máxima, em primeiro lugar.
– Vou manter minha ordem! – respondeu ele, por fim – Se o Dr. Peter se abster, eu serei o médico do novo paciente.
– Isso… não é bom, Dr. – respondeu Ah Ri, parecendo extremamente preocupada.
– Não me diga que você também acha que o novo paciente vai acabar morrendo por causa da Ha Na. Essa histeria em massa está destruindo a vida de uma jovem que não sabe o que é liberdade. Então, não fale mais asneiras na minha frente e faça o que eu mandei, Ah Ri!
A secretária ainda titubeou por alguns minutos, mas resolveu anuir e sair da sala de Park In.
Se ele saísse da diretoria do Instituto, ele não tinha dúvidas de que Ha Na seria ignorada novamente e relegada à solidão e à sujeira que estava antes.
Ele teria que manter o EPT e os terrores noturnos em segredo do Dr. Peter por mais algum tempo. Pelo menos, até saber exatamente o que se passava com Ha Na.
Ao mesmo tempo, ele teria que se controlar, pois sua rispidez para com a competente Ah Ri só demonstrava seu nervosismo. Isso, e pequenos tremores em sua mão que iniciaram naquela manhã e não estavam parando.
O paciente da B16 se chamava Choi Oh-Dal, o assassino.
Era um psicopata de marca maior: havia estuprado, torturado e matado jovens mulheres em 6 cidades diferentes. Ao ser capturado pela polícia, confessou tudo enquanto tinha um ataque de riso, e não era por nervosismo. Ele se gabava do que tinha feito e disse que faria tudo novamente, se fosse solto.
Ele atacou policiais, feriu os três defensores públicos que tentaram ajudá-lo e conseguiu assassinar a psiquiatra que lhe deu o diagnóstico.
As reclamações por causa de Choi Oh Dal não diminuíram na cadeia. Ele não obedecia a regras, era violento e matou todos os companheiros de cela apenas porque eles roncavam muito durante a noite.
Ele recebeu a pena capital e morreria em 5 anos por injeção letal, mas um outro psiquiatra acabou descobrindo que ele tinha uma lesão no lobo frontal, sequela das surras que levara do pai na infância.
Como havia casos de psicopatia relacionados a tumores e lesões no lobo frontal, a pena de Choi foi transmutada para perpétua, com acompanhamento psiquiátrico em um instituto especializado e de segurança máxima.
Park In não queria receber Choi em Jihan, mas devia um favor ao Diretor da Penitenciária de Seul, então não teve como recusar.
Ao visitar a ala B, Park In se assustou com o tamanho de Choi Oh Dal. Perto de Há Na que era mirrada, angelical e pequena, o homem mais parecia um monstro. Tinha 1,98 de altura, era todo tatuado, musculoso e grandalhão. No peito, que ele fazia questão de deixar à mostra, estava tatuado “O Assassino”.
– Choi Oh Dal, eu sou Hong Park In, o seu médico psiquiatra, a partir de agora, iremos iniciar o seu tratamento. Vi no seu prontuário que você toma 3 remédios diferentes para dormir, pode me dizer o que está acontecendo?
Como fazia com Ha Na, Park In colocou a cadeira na frente da parede de vidro da cela, pois não era inteligente fazer nenhuma consulta com ele em um consultório como era com os demais pacientes das outras alas.
Choi Oh Dal não respondeu. Parecia absorto. Do canto dos lábios direitos, havia saliva caindo. Ele parecia muito dopado. Era inútil fazer qualquer interação por hoje.
Em seguida, Park In resolveu se levantar e estava indo para a frente da cela ao lado – onde ficava Ha Na, quando escutou um estranho som saindo de Oh Dal
– In Na… – balbuciou o assassino.
– Como é? – Perguntou Park In, um pouco abalado.
Fora a mesmo coisa que a criatura negra que o atormentava nos terrores noturnos havia dito um pouco antes de sumir. O nome de sua esposa parecia badalar em sua consciência como que lhe lembrando de sua culpa.
– Deixe-o aí, doutor. Não tire esse homem desta cela, por favor!
Park In saiu de sua consciência ao ouvir a vozinha suplicante de Há Na.
– Achei que você me pediria para retirá-lo da cela ao lado. Não deve ser fácil ter um predador sexual como vizinho. Não sei onde estava com a cabeça ao pensar em deixá-lo aqui. Vou movê-lo o quanto antes, não se preocupe, Ha Na!
– Não, doutor… por favor… eu preciso dele! Eu preciso no Assassino exatamente onde ele está. É para o seu bem, também!
– O que quer dizer com isso, Ha Na? – perguntou Park In, olhando para Ha Na sem entender nada. Novamente, ela olhava para a câmera à esquerda, como se avaliasse se deveria ou não dizer algo.
– É bom ter companhia de vez em quando. – respondeu ela, evasivamente.
– Ainda que de alguém como ele? – perguntou o doutor, apontando para o brutamontes psicopata que babava na cela ao lado.
Park In saiu da sala B com a mente pesada. Por que ele havia escutado o nome de In Na na boca de um homem como Oh Dal. Sua psicose dava sinais cada vez mais claros e fortes de que ele estava perto de um colapso.
– Ah Ri, será que você pode chamar o Dr. Peter aqui! – perguntou Park In, no interfone, assim que sentou em sua cadeira.
Sua intenção era conversar com o colega de trabalho para iniciar um tratamento o quanto antes.
– Infelizmente o Dr. Peter não está no instituto, Senhor. – respondeu a eficiente secretária – Ele atendeu a uma ocorrência: um paciente externo teve um colapso.
– Ok, se ele aparecer, por favor, envie-o a minha sala, por favor!
Infelizmente para ParK In, o Dr. Peter não apareceu mais naquele dia. Ele teria que esperar um pouco mais para contar a alguém o que realmente estava acontecendo com ele.
Naquela tarde, resolveu sair um pouco mais cedo do trabalho para ir descansar. Já fazia noites que ele não dormia direito. No banheiro do quarto, procurou na frasqueira de sua mulher até encontrar um frasco de comprimidos para dormir. Pensou em tomar pelo menos um, mas depois disso, desistiu. Automedicação poderia complicar as coisas. Amanhã, falaria com o Dr. Peter e iniciaria um tratamento decente para seus transtornos.
Durante a noite, acordou assustado. Não conseguia se mexer, como sempre. Entretanto, ao invés daquela estranha figura esguia e sombria para lhe fazer companhia, havia uma luz tremeluzente azul belíssima que iluminava o quarto. A luz se concentrava em um pequeno ponto que iria aumentando a medida que Park In o admirava.
Em seguida, era possível ver uma silhueta feminina pequena e delicada e o corpo de Ha Na simplesmente se manifestou sentada na beirada de sua cama.
– Não tenho muito tempo, doutor, então me escute, por favor. A criatura que vive em mim consome a energia das pessoas que se aproximam de mim. Está tentando fazer isso com o senhor e esta noite, está atormentando o ASSASSINO. É a energia dele que estou usando para vir aqui, por isso, não deixe o ASSASSINO sair da cela ao lado, pois ele deixará você em paz por algumas noites.
Era a loucura se manifestando, pensou Park In. Muitas vezes, quando era apenas um estudante maravilhado da psiquiatria e psicologia, quis muitas vezes poder estar dentro de um cérebro atormentado para poder decifrar todos os transtornos a fim de dar um pouco de paz a seus pacientes. E agora, ali estava ele, tendo uma visão de sua própria paciente, que aparecia a sua frente tão etérea quanto no primeiro dia em que a viu.
– O senhor precisa me ouvir: vá embora! A criatura ainda não conseguiu te atingir… por favor, vá embora, Doutor… o senhor foi a única pessoa que se importou verdadeiramente comigo, por isso, eu lhe imploro… vá embora enquanto ainda dá tempo.
Os olhos de Ha Na ficaram marejados, como se ela estivesse com muito medo ou preocupada.
– Se o senhor ficar, ele irá te destruir… A fruta que eu mais gosto é pêssego, doutor… lembre-se disso… essa é a nossa palavra-chave…pois não podemos falar abertamente em Jihan. Há pessoas observando. Não confie em ninguém! Em ninguém, doutor… especialmente, no Dr. Peter.
No instante seguinte, os olhos amedrontados de Há Na se dissiparam no ar, deixando um leve perfume adocicado no quarto. Se Park In acreditasse em anjos, diria que acabou de receber a visita de um. Entretanto, Park In não acreditava em anjos… nem em criaturas sombrias ou aparições ou alucinações.
Park In acreditava na ciência e apenas no que a ciência poderia explicar. Um ser angelical manifestara-se à sua frente, como explicar isso? Suas alucinações agora idealizavam Ha Na como um anjo. Sua mente começava a lhe pregar peças!